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Quando todos os meios de informação taurina iniciam a publicação dos balanços da temporada de 2013, que há pouco findou, pensámos, no “portadossutos” fazer, não o nosso balanço mas, e antes pelo contrário, fazer um “anti-balanço”, ou a “desconstrução do balanço” dessa mesma temporada. Fazemo-lo não por queremos ser originais, mas para que este anti-balanço constitua um ponto de reflexão sobre determinadas questões que, a não serem resolvidas poderão, em muito, comprometer o futuro do espectáculo tauromáquico em Portugal.

 

Comecemos pela actividade empresarial: Não é possível pensar na defesa nem na promoção do espectáculo tauromáquico em Portugal enquanto a matriz empresarial do nosso país for aquela que é! Sabemos que as empresas verdadeiramente profissionais não chegam à”mão-cheia”; as restantes regem-se, uns pelo mais puro amadorismo, outros adoptaram comportamentos que são verdadeiros casos de polícia. Resultado: alinham em loucuras para arrematar praças, sem cuidarem de avaliar da viabilidade económica daquilo que aceitam pagar como renda; Porque vivemos em “estado de crise”, baixaram as receitas de bilheteira, diminuíram as receitas de patrocínios e na hora de fazer contas o resultado escreve-se a vermelho. Ou seja em vez de lucro, há prejuízo, o que tem como consequência o incumprimento do acordado com artistas e ganaderos e restantes intervenientes no espectáculo. O comportamento suicidário de certos empresários levou ainda à insistência em promover corridas em datas não tradicionais, o que agravou os desastrosos resultados de exploração das suas praças. Houve redução do número de espectáculos comparativamente com 2012, mas mandava a prudência que essa redução tivesse sido mais significativa. Chegados ao fim da temporada começam a aparecer os resultados desta gestão, com artistas a reclamar honorários não pagos, apoderados a fazerem autênticas esperas a empresários e ganaderos a verem o dinheiro dos seus toiros “por um canudo”.

 

Salvo muito, mas muito raras excepções, as carreiras dos cavaleiros portugueses foram, mais uma vez, mal geridas, com as figuras a desgastarem a sua imagem, em vez de a preservar. Os novos (a maioria deles cavaleiros de dinastia) não parecem ter a mesma garra que os seus pais demonstraram nos anos 80 e 90 do século XX, quando quase todos eles foram figuras. Por outro lado, o toureio a cavalo em Portugal perde, a cada dia que passa, essa imagem de senhorio e fidalguia que estão na sua génese. A função do tricórnio está resumida às cortesias e à volta à arena; a rabicheira vai caindo em desuso, na boca usa-se toda a espécie de apetrechos para sujeitar o cavalo: a serreta é parte integrante da focinheira agora com a ”inovação” de a “ligar” à testeira, fixando-a bem no chanfro, que normalmente se apresenta ou em chaga, ou “calcinado”. Da focinheira sai um cabo de aço que passa pelo freio e é embutido na rédea de couro. A gamarra fixa está para o cavalo como a gravata está para o homem de negócios. Por outro lado, o treino dos cavalos é cada vez mais “avacado”. Os cavaleiros forçam voltas à arena sem que o público lhas peça. Valoriza-se o fácil e o espectacular em detrimento da verdade inerente a citar de praça a praça, templar com o peito do cavalo e cravar de frente, nos médios e ao estribo. Venham ferros de palmo e violinos cravados com o cavalo atravessado e de preferência à garupa que é para o cavaleiro se “esticar” mais para trás na sela, que isso é que é “bonito”…e quando lhe faltar braço, que se lhe adapte um mecanismo extensível. Também houve quem se preocupasse com praticar o toureio a cavalo segundo as regras ancestralmente definidas, mas esses, infelizmente, são espécie em vias de extinção. Há que preparar um programa de preservação da espécie como se fez e como se faz ao Lince da Malcata e ao Lobo Ibérico. Programa esse que passa por “dar escola” a quem, apesar de demonstrar valor para a profissão, não teve oportunidade de a frequentar.

 

Os forcados mantiveram o seu elevado espírito de generosidade, que outra coisa não seria de esperar do seu assumido amadorismo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Não fora o esforço das escolas de toureio e o toureio a pé em Portugal, que está moribundo, já seria um defunto para além da missa de sétimo dia…Deve-se às escolas de toureio a esperança em três ou quatro nomes que começam a despontar e que, caso se confirmem em Espanha, que é para onde terão de seguir “para aprender o oficio”, poderão mudar alguma coisa no que a esta modalidade-mãe do toureio respeita.

 

O toiro é o elemento base da tauromaquia…esta parece de Monsieur de La Palice”, mas lá que é verdade, é verdade….Por isso nos custa, enquanto aficionados ver o progressivo acomodamento dos ganaderos à vontade das figuras. As figuras fazem-se lidando toiros bravos, mansos, fáceis e difíceis. O público tem de intuir que lidar um toiro não é o mesmo que fazer festas a uma ovelha. Tem de ir à praça, sentar-se na bancada e perceber que o toureio é um privilegiado pois é mais valente que qualquer um que está na bancada. O espectador tem de sentir um arrepio em cada sorte que o toureiro realiza. Numa palavra: A arte leva gente aos toiros, mas a emoção leva muito mais gente e, se o espectáculo tauromáquico perdura, é mais pela emoção que pela arte que transmite ao púbico, embora uma não possa viver sem a outra. Por isso, queremos ver em praça toiros com idade, peso, trapío, mobilidade, casta, em suma: com todas as qualidades que fazem deste nobre animal aquilo que ele é e não aquilo que, artistas mandões e ganaderos acomodados, querem fazer dele. Saudemos pois os ganaderos que resistem à moda do comodismo…e são ainda alguns, felizmente.

 

Finalmente uma palavra para a critica. Saúda-se a quantidade de gente que hoje em dia escreve de toiros, sobretudo na internet…lamenta-se que a qualidade não seja directamente proporcional à quantidade, Que bom seria, com os meios de hoje, podermos ter na net homens, como Nizza da Silva, Saraiva Mendes, José Lanceiro, Leopoldo Nunes, Cabral Valente, Manuel Azambuja, Fernando Teixeira e tantos outros, que não nos acodem agora à memória, mas tão dignos de figurar nesta evocação quanto estes…

 

Pois é, caros leitores: Não sabemos se conseguimos fazer o anti-balanço de uma temporada que deixa mais interrogações que saudades mas, pelo menos, ficam aqui algumas pistas que poderão ser importantes para todos reflectirmos durante o defeso.

 

José Dias

josedias@portadossustos.com

 

O ANTI-BALANÇO DA TEPORADA DE 2013 

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